13 agosto 2012

Classes sociais e votos

Rectificação a um jornalista,
observação a um politólogo


Sob este título, que veicula uma ideia de que nem sequer discordo no essencial mas que sublinho estar longe de ser um fenómeno recente, aqui e lá fora), o Público dá hoje à estampa uma peça em torno destas questões.

Deixando para outra altura uma eventual abordagem mais densa desta problemática, por hoje só quero fazer uma rectificação a algo afirmado pelo jornalista autor da peça e a uma afirmação de um politólogo que deu a sua opinião.

Quanto ao jornalista, acontece que este, a dado passo, afirma que (sublinhados meus) «o caso francês, com a Frente Nacional de Marine Le Pen, é paradigmático. O partido, atacando fortemente as políticas pró-emigração, conseguiu obter nas legislativas francesas, em Nord-Pas de Calais, uma vitória esmagadora. Importa dizer que esta circunscrição é maioritariamente composta por elementos da classe operária, outrora bastião da esquerda radical».

A este respeito, não está em causa obviamente que a FN nessas eleições tenha sido o 2º partido em voto operário, embora seja de lembrar que, nas anteriores, até tinha sido o primeiro. Trata-se sim de informar o jornalista e os leitores que, nas eleições deste ano, no departamento de Pas de Calais (resultados aqui), que tem 12 circunscrições, a Frente Nacional só venceu em duas na 1ª volta e não venceu nenhuma na 2ª volta, com a agravante que foi na 11ª (Hénim-Beaumont) que Marine Le Pen foi derrotada na 2ª volta. Se isto é uma «vitória esmagadora», então vou ali e já venho.

Já quanto ao politólogo trata-se de comentar  afirmações de de António Costa Pinto que, segundo o jornal «estabelece uma diferença fundamental entre BE e PCP. Enquanto o primeiro tem "segmentos sociais muito diversificados", o outro assume um discurso em que "se reivindica de um grupo social determinado, que são os operários, os assalariados rurais [?] e, nos últimos anos [?], os pequenos e médios agricultores».

Com a preocupação de ser sério e rigoroso, anoto devidamente que Costa Pinto, quanto ao PCP, se reporta ao «discurso» e não à composição social do seu eleitorado.  Mas ainda assim, mesmo só no plano do discurso, a descrição de Costa Pinto é completamente irreconhecível uma vez que é patente e demonstrável que no «discurso» do PCP a referência abrangente aos «trabalhadores» sobreleva compreensivelmente a referência exclusiva aos «operários» e que os «assalariados rurais» deixaram, por razões de adequação à realidade social, de ter o peso que tiveram no passado já distante e que entretanto ganharam peso aos referências aos micro, pequenos e médios empresários e aos trabalhadores precários.

E se, porventura, Costa Pinto estendesse a sua afirmação à composição social do eleitorado do PCP e da CDU, a sua definição ainda seria mais pobre pois é uma evidência que os trabalhadores dos serviços (sejam do sector privado sejam da administração pública) têm certamente um peso considerável no eleitorado do PCP.

Dito isto, lembro que, nesta matéria,  há confusões que já vêm dos alvores da revolução de Abril e dos anos seguintes. Nessas épocas, eram às carradas os jornalistas e comentadores que quase queriam limitar o voto no PCP, para além das cinturas industriais, ao Alentejo. Confundindo percentagens com número de votos, nunca repararam que, mesmo em 1979, os votos na então APU em Évora, Beja e Portalegre não representavam mais do que  13% % da sua votação nacional .

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